terça-feira, 13 de março de 2007

Isto não é um cocô







Era sábado, como de costume, caminhava, afinal apenas os pensamentos que temos caminhando valem de alguma coisa, lendo Nietzsche na Beira Rio. De repente, o susto: ao erguer os olhos da página encontro estendida, na Ponte de Ferro, uma faixa, que apontando para o Rio Itajaí-Açu, dizia: ISTO NÃO É UM COCÔ.

Fiquei estarrecido. Imóvel. Assombrado. Entre os urros fetichizados e pueris das bandas locais; entre as pinceladas codificadas e normativas das associações de artistas plásticos alguém teve a coragem de produzir arte contemporânea em Blumenau.

Em 1926 o artista belga René Magritte presenteou a humanidade com o seu: Ceci n'est pas une pipe: Isso Não É Um Cachimbo. Intervenção analisada por Michel Foucault em livro com o mesmo título. Na obra, o artista faz falar o desconforto da inexatidão, desconforto próximo àquele das inclusões sociais, das proteções ecológicas que estão para além de estética da beleza.

Na intervenção da ponte, além de acolher a feiúra dos erros, dos limites e das ausências – valores éticos frente ao mundo e aos seus desafios subjacentes que clamam teimosamente para serem lembrados – o que achei mais interessante foi a sutil ironia com relação as necessidades privadas de todos nós.

Cada vez mais a Vida Privada nega espaço à Vida Coletiva. Mais que isso as necessidades privadas estão – literalmente – cagando no Coletivo.

Se o Rio ainda é de todos, o Homem Privada entende que ele não é de ninguém. Alias, o Homem privada só consegue conjugar dois verbos para o território coletivo: privatizar e destruir.

E atenção, pois o melhor vem agora. Deste lugar público, onde a faixa pairava, um grupo – aproximadamente 13 jovens – talvez inspirados por Lygia Clark e Hélio Oiticica lançaram esculturas flutuantes no rio. Ao todo foram sete objetos, os quais em conjunto, lembravam fezes humanas, antes da descarga, na privada doméstica.

O Grupo foi extremamente cuidadoso ao recolher cada um dos objetos utilizados na intervenção Artístico-Ecológica. Um desses objetos ficou preso numa espinheira onde o barco a remo não conseguia chegar devido a forte correnteza das águas. Do ponto de ônibus onde acompanhei o desenlace da intervenção vi dois rapazes entrarem a nado nas águas do Itajaí Açu, e depois de muita luta recolher o objeto.

Não fizeram nenhuma poluição. Não destruíram nada. Apenas chamaram a atenção para um ponto importante em termos de arte ecologia.

Um bonito e profundo trabalho que infelizmente não foi compreendido pelo Jornalista Evandro de Assis. O qual em sua página Informe no dia 05 de março defende que somente a obra privada é legítima.

Como todo o esforço do grupo, ao que me parece, residiu justamente em criticar o mundo privado a obra não poderia, de forma alguma, ser assinada. Mas, Evandro diz que sem assinatura privada a obra perde sua legitimidade, que ele só consegue enxergar, nessa intervenção, "falta de educação." A Pergunta que me levou a escrever esse artigo é: de quem, exatamente, é a "falta" de educação?

Ernesto Silva é poeta e filósofo.

segunda-feira, 12 de março de 2007

Isto não é um Jornal 2





E não entendeu também o artigo do Sr. Ernesto Silva.

Isto não é um Jornal 1


Sem saber de que se tratava, o Jornal de Santa Catarina publicou uma nota sobre o "Isso não é um cocô".
Meus caros jornalistas, vocês perderam o melhor da festa. A intervenção começou de manhã, contou com a participação de várias pessoas, a faixa não foi o único elemento utilizado. Vocês não viram os cocôs boiando no Rio Itajaí? E o vaso sanitário? Não ganharam nem um pedacinho de papel higiênico? Também não viram ninguém nadando no rio??... Lamento lhes dizer, mas essa apuração dos fatos foi mesmo uma m...

Isso não é um cocô, por Ernesto Silva ( ou Isso não é um Jornalista)


Era sábado, como de costume, caminhava, afinal apenas os pensamentos que temos caminhando valem de alguma coisa, lendo Nietzsche na Beira Rio. De repente, o susto: ao erguer os olhos da página encontro estendida, na Ponte de Ferro, uma faixa, que apontando para o Rio Itajaí-Açu, dizia: ISSO NÃO É UM COCÔ.

Fiquei estarrecido. Imóvel. Assombrado. Entre os urros fetichizados e pueris das bandas locais; entre as pinceladas codificadas e normativas das associações de artistas plásticos alguém teve a coragem de produzir arte contemporânea em Blumenau.

Em 1926 o artista belga René Magritte presenteou a humanidade com o seu: Ceci n'est pas une pipe: Isso Não É Um Cachimbo. Intervenção analisada por Michel Foucault em livro com o mesmo título. Na obra, o artista faz falar o desconforto da inexatidão, desconforto próximo àquele das inclusões sociais, das proteções ecológicas que estão para além de estética da beleza.

Na intervenção da ponte, além de acolher a feiúra dos erros, dos limites e das ausências – valores éticos frente ao mundo e aos seus desafios subjacentes que clamam teimosamente para serem lembrados – o que achei mais interessante foi a sutil ironia com relação as necessidades privadas de todos nós.

Cada vez mais a Vida Privada nega espaço à Vida Coletiva. Mais que isso as necessidades privadas estão – literalmente – cagando no Coletivo.

Se o Rio ainda é de todos, o Homem Privada entende que ele não é de ninguém. Alias, o Homem privada só consegue conjugar dois verbos para o território coletivo: privatizar e destruir.

E atenção, pois o melhor vem agora. Deste lugar público, onde a faixa pairava, um grupo – aproximadamente 13 jovens – talvez inspirados por Lygia Clark e Hélio Oiticica lançaram esculturas flutuantes no rio. Ao todo foram sete objetos, os quais em conjunto, lembravam fezes humanas, antes da descarga, na privada doméstica.

O Grupo foi extremamente cuidadoso ao recolher cada um dos objetos utilizados na intervenção Artístico-Ecológica. Um desses objetos ficou preso numa espinheira onde o barco a remo não conseguia chegar devido a forte correnteza das águas. Do ponto de ônibus onde acompanhei o desenlace da intervenção vi dois rapazes entrarem a nado nas águas do Itajaí Açu, e depois de muita luta recolher o objeto.

Não fizeram nenhuma poluição. Não destruíram nada. Apenas chamaram a atenção para um ponto importante em termos de arte ecologia.

Um bonito e profundo trabalho que infelizmente não foi compreendido pelo Jornalista Evandro de Assis. O qual em sua página Informe no dia 05 de março defende que somente a obra privada é legítima.

Como todo o esforço do grupo, ao que me parece, residiu justamente em criticar o mundo privado a obra não poderia, de forma alguma, ser assinada. Mas, Evandro diz que sem assinatura privada a obra perde sua legitimidade, que ele só consegue enxergar, nessa intervenção, "falta de educação." A Pergunta que me levou a escrever esse artigo é: de quem, exatamente, é a "falta" de educação?

Ernesto Silva é poeta e filósofo.